O Papel da Cultura na Economia do Brasil por José Pastore

Queridos,

Tenho a honra e o privilégio de conhecer de perto um homem maravilhoso, que entende os caminhos e descaminhos da sociedade e da humanidade, através de um olhar prá lá de especial.
Falo do Professor José Pastore, que entre tantos outros pensamentos, escreveu este que posto aqui, através do qual integrou com propriedade impar, a arte e a cultura, na única linguagem que move o poder e o mundo hoje em dia: a economia!

Leiam e distribuam, pois nós artistas, há muito precisávamos desta interlocução!

Boa leitura, com todo o carinho.

O Papel da Cultura na Economia do Brasil
José Pastore

Os bens culturais são formados por elementos tangíveis e intangíveis que não podem ser separados. Uma escultura é um objeto físico e, como tal, é tangível. Mas o valor da escultura depende da parte intangível.
A parte intangível é composta de valores, sentimentos e símbolos que, apesar de não serem mensuráveis, são essenciais para dar o valor ao bem tangível.
A combinação de todos os elementos tangíveis e intangíveis forma o capital cultural da sociedade. Aqui entram a educação e as várias formas de expressão cultural – o folclore e as artes plásticas, o teatro e o cinema, o circo e a música, o livro e o patrimônio histórico e assim por diante.
O que se consegue medir é o lado tangível do capital cultural. Mais especificamente, o que se consegue medir é a produção cultural – as obras de arte, os espetáculos, os livros, etc. Pesquisas recentes indicam que na formação do capital cultural do mundo, os Estados Unidos respondem por 55% da produção; a União Européia, 25%; o Japão e a Ásia, 15%; e a América Latina, 5%.
Certamente, teremos discordâncias neste auditório se considerarmos a dimensão intangível da produção cultural do mundo. Nós do Brasil, não podemos nos conformar com apenas parte dos 5% que cabem à América Latina. Afinal o Brasil tem revelado um alto grau de criatividade na música, cinema, televisão, artesanato, teatro e vários outros ramos do setor da cultura.
Mas essa é uma limitação das pesquisas sobre a economia da cultura. O que os economistas conseguem medir é o valor de mercado da produção cultural. E, a partir dessa medida, avaliar o peso que essa produção tem na formação da produção total, ou seja, do PIB, na criação de oportunidades de trabalho, na geração de impostos e na estimulação de empregos indiretos.
Não há consenso, porém, que a análise econômica despreza a dimensão intangível. Os economistas argumentam, porém, que o valor de mercado carrega consigo o valor da dimensão intangível. Ou seja, um livro produzido industrialmente vale no mercado não apenas o papel e a tinta que foram investidos. Ele vale, sobretudo, pelo seu conteúdo – que é a parte intangível.
É claro que existem economias de escala nesse campo. Um livro de Jorge Amado custaria dez vezes mais no mercado se a tiragem se limitasse a poucos milhares de exemplares. As tiragens repetidas de 100 mil exemplares permitem assegurar ao autor o valor do intangível e premiar o consumidor com um preço acessível. É o resultado da produção em massa, trazido pela industrialização dos produtos culturais.
Mas, em certos campos isso é impossível. É por isso que uma escultura da artista plástica Tomie Ohtake ou um ingresso do concerto de fim de ano da Filarmônica de New York custam tão caros. Trata-se de fatos únicos e que não podem ser reproduzidos em grande escala. Nesses casos, o valor da dimensão intangível não pode ser rateado como ocorre com uma grande tiragem de um livro ou de um filme de Hollywood.
Por isso, as políticas que tratam da promoção da cultura são necessariamente variáveis. O que se aplica ao livro, não se aplica à pintura. O que vale para o teatro não vale para a televisão.
Não é fácil formular uma política nacional de cultura que incorpore a flexibilidade que o setor requer. Colocar na Constituição e nas leis é fácil. Executar é difícil. É por isso que elas são deixadas aos artistas. Sim porque a execução de uma política multifacetada para a área cultural é um empreendimento mais artístico do que técnico. Só os protagonistas da criação cultural podem encontrar a dose certa para combinar uma política de eventos com uma política cultural – se é que se pode falar em certo ou errado nesse campo. Mesmo assim, eles precisam de coordenação. Do contrário, a flexibilidade se transforma em desarticulação, o que gera desperdícios.
Para nós técnicos, ficam as tarefas de análise do impacto da cultura no crescimento econômico e no progresso social de uma nação assim como na tarefa de identificar os constrangimentos econômicos e institucionais que impedem que o estoque de valores e sentimentos intangíveis se transforme em produtos culturais tangíveis.
Os produtos culturais são bens de consumo. As sociedades mais ricas consomem mais produtos do que as sociedades mais pobres. Mas, mesmo entre os pobres, o consumo de produtos culturais ocorre de modo ajustado à sua realidade. Os temas do folclore, por exemplo, se incorporam nas mais variadas formas de produtos que são consumidos por grupos de alta e de baixa renda. E o Brasil tem uma riqueza fantástica nessa área. Mas não apenas nela. A criatividade aparece também nas formas mais novas em que a arte se incorpora à engenharia e à informática como ocorre no campo do design do vestuário, dos móveis, dos produtos gráficos ou do áudio visual que usa técnicas avançadas.
Todos esses produtos culturais encontram mercado de consumo. As estimativas disponíveis para o Brasil, indicam que as famílias brasileiras consomem anualmente cerca de R$ 32 bilhões no campo da cultura. Esses dados são de 2002 e devem estar subestimados. De qualquer forma, eles representam cerca de 3% dos gastos das famílias e 2,4% do PIB. É claro que na frente deles estão a alimentação, a saúde, a moradia, o transporte e outros de primeira necessidade. Mas não se pode dizer que os bens culturais fazem parte do mundo dos supérfluos.
A maior parte do consumo cultural brasileiro se dá dentro do domicílio. De fato, 85% dos dispêndios se referem à televisão, vídeos, música e leitura. Na é para menos. A maioria dos municípios do país não dispõe de cinemas, teatros, museus, salas de espetáculos que podem levar o consumidor de cultura para fora de casa. E nem programas que estimulem o afloramento dos talentos nas várias áreas da cultura. Menos de 5% possuem secretarias de cultura. A caminhada é longa nesse campo e os participantes deste seminário conhecem o problema de falta de acesso melhor do que eu.
Estímulos bem dirigidos podem ampliar a gama de produtos consumidos e estimular a criação de cultura. O crescimento da produção, por sua vez, é estimulado pelo crescimento da demanda. Não há a menor dúvida de que esses estímulos são de grande importância.
A Orquestra Sinfônica Heliópolis, por exemplo, é de primeira qualidade no ramo sinfônico e já foi dirigida pelos melhores maestros do mundo, dentre eles, o Zubin Mehta. Essa orquestra nasceu e floresceu na maior favela de São Paulo como resposta a um estímulo bem direcionado na formação de jovens talentosíssimos que estavam à espera de uma oportunidade para mergulhar na música. Moças e rapazes saíram das condições mais adversas para se apresentar nos grandes palcos, inclusive, no Carnegie Hall de New York como ocorreu em fevereiro de 2008 quando a Orquestra Filarmônica de Israel, da qual faz parte um ex-integrante da Orquestra de Heliópolis, fez uma temporada naquela cidade.
O Brasil tem centenas de exemplos nesse campo. Um programa de calouros no campo da música clássica, levado ao ar pela TV Cultura de São Paulo (Prelúdio) e sob a direção do Maestro Julio Medaglia, está descobrindo uma imensidão de músicos talentosos que conquistam uma boa profissão e levam prazer ao público em geral, inclusive os mais pobres que rapidamente apreendem a gostar de Bach, Mozart, Beethoven, Villa Lobos e Stravinsky.
A área cultural tem essa característica. É diferente dos grande setores industriais ou comerciais. Pequenos estímulos bem direcionados descobrem e promovem talentos que, de outra forma, ficariam retraídos na sociedade. E, com isso, desenvolvem-se as atividades culturais que acabam gerando bem estar para os consumidores e para os produtores de cultura, além de formar mercados de consumo e de trabalho.
Cultura gera prazer e gera empregos. As pesquisas de 2002 indicaram que o Brasil gera cerca de 700 mil postos de trabalho formais na área cultural, incluindo edição de livros e leitura, cinema e vídeo, rádio e televisão, teatro, música e espetáculos, conservação e patrimônio, fonografia, atividades fotográficas e entretenimento em geral. Passados seis anos e com o crescimento dos incentivos, é bem provável que os empregos formais na área cultural dos dias de hoje estejam na casa dos 800 mil.
Mas essa conta está incompleta. O trabalho na área da cultura é, em grande parte, informal. Para muitos profissionais, os tempos bons são sempre seguidos de tempos ruins. Ora têm trabalho. Ora não têm. E, no que tange à informalidade, há ainda muita atividade que não é regida pelo contrato de trabalho com carteira assinada e direitos garantidos.
Isso sugere uma subestimação do numero de pessoas que trabalham com cultura. É isso, certamente, que levou Gilberto Gil e Paula Porta a estimar em 1,6 milhões de pessoas os que trabalham nesse campo (Gilberto Gil e Paula Porta, "Economia da cultura", Folha de S. Paulo, 03/02/08) – quase 2% da força de trabalho. A estimativa é bastante razoável. Se, no mercado de trabalho em geral, há 54% de informalidade, sabe-se que no mercado da cultura essa proporção é muito maior.
Tomemos a área do entretenimento. A grande maioria dos que trabalham com artesanato, folclore, circo e música, especialmente no interior do Brasil, são informais. Vejam o caso do Carnaval. As escolas de samba movimentam verdadeiros exércitos de costureiras, marceneiros, mecânicos, pintores, aderecistas, iluminadores, técnicos de som, e tantos outros profissionais que trabalham intensamente para colocar os desfiles na avenida. Além disso, mantém inúmeros programas sociais para a comunidade. É trabalho para o ano inteiro.
Nada disso é contabilizado para compor o emprego e o PIB da cultura. O que é informado para compor as contas nacionais desse setor é a crescente produção cinematográfica, a montagem de peças em teatro com bilheteria registrada, os programas de televisão, os conjuntos musicais que emitem nota fiscal, as artes plásticas apresentadas em galerias, exposições e museus organizados, a dança com registro nos órgãos públicos e outras manifestações que mantém registros contábeis.
As atividades culturais vão muito além do que é visível e contabilizado. Se levarmos em conta todos as atividades e toda a receita geradas pelas inúmeras formas de manifestações informais, o emprego da cultura deve estar mesmo em torno de 1,6 milhões – ou até mais - e a participação no PIB deve ultrapassar a cada dos 3%. Para o mundo, o Banco Mundial estima que a cultura responde por 7% do PIB global, sendo o entretenimento responsável por dois terços do total.
Esse é um dos setores que mais cresce no mundo. Nos Estados Unidos, teatro, música, cinema e televisão geraram, em 2006, cerca de US$ 70 bilhões - o dobro do registrado em 1990, em termos reais. Cinqüenta por cento dos empregos e dos salários vieram do teatro de New York e do cinema e da televisão da Califórnia ("The arts and entertainment industries", Labor Mohntly Review, outubro de 2007).
O setor tem um potencial enorme no Brasil. Neste momento em que discute a reformulação dos incentivos fiscais à cultura em geral, vale a pena mencionar que, com os mesmos recursos que o governo destina ao setor, a quantidade de empregos poderia ser maior e mais estável. Bastaria reorientar os incentivos – não para os mega-espetáculos – e sim para as centenas de milhares de manifestações que ocorrem nas cidades e no interior do Brasil.
Os recursos envolvidos na promoção da cultura são expressivos. Os recursos públicos dos três níveis de governo em geral estão estimados em mais de R$ 2 bilhões anuais. Só o governo federal investe na forma de incentivos cerca de R$ 1 bilhão por ano. O BNDES investirá R$ 4,7 bilhões entre 2008 e 2010 (Programa Mais Cultura).
Com os mesmos recursos e um pouco mais de racionalidade, o Brasil pode gerar uma maior quantidade de empregos e muito mais renda para os brasileiros. O próprio Ministro da Cultura confessa seu inconformismo ao constatar que aquela pasta destinou, em 2007, cerca de R$ 108 milhões para os grandes espetáculos de teatro que cobraram ingressos no valor de um salário mínimo para uma elite que não precisa de incentivos para assistir espetáculos como esses. A opção por grandes montagens vem do sistema atual no qual grande parte do lucro dos produtores vem dos incentivos fiscais e não das bilheterias (Celso Frateschi e Juca Ferreira, " Incentivo ao teatro?", in Folha de S. Paulo, 27-03-2008).
Ou seja, há muito que explorar do lado da demanda assim como há muito que fazer do lado da oferta. Há uma vasta área para a formação de pessoal ainda intocável. Voltemos ao caso do teatro. Esse setor precisa de profissionais para os quais nem preparação existe. O consagrado diretor de teatro José Possi Neto tem insistido, com razão, na necessidade de se criar escolas para preparar os jovens na arte da marcenaria dos cenários, nos segredos da costura dos figurinos, nas técnicas de iluminação e sonorização de um espetáculo e tantas outras atividades que, apesar de não aparecerem na ribalta, são as que garantem a boa qualidade dos espetáculos.
Está aí um campo de trabalho muito promissor para jovens e adultos. Não é preciso montar superestruturas para preparar esses profissionais. Cursos desse tipo podem ser dados em locais simples e com pouco equipamento. Tais projetos, assim como as boas escolas de arte dramática e de música, merecem apoio, pois fazem parte da tão necessária qualificação de mão-de-obra.
Esse mercado é promissor não apenas em termos de emprego, mas também de renda. O salário hora das atividades culturais – na média – é cerca de 30% superior do que a média do salário-hora do país. No terreno dos espetáculos, em especial os que são realizados ao vivo, o salário hora chega a superar em 56% a média nacional.
Além dos recursos do setor público, há a contribuição do setor privado. É crescente a literatura que registra a grande proliferação de ações voluntárias no campo social. Um artigo recente analisa essas iniciativas como um passo concreto na modernização do sistema capitalista por meio da regulação privada (Tim Bartley, "Institutional Emergence in a Era of Globalization", American Journal of Sociology, Vol. 113, no. 2, setembro de 2007).
Os movimentos de protestos e as controvérsias em torno da utilização do trabalho em condições desumanas e da depredação do meio ambiente instigaram a emergência de um grande numero de campanhas através das quais a sociedade se organiza para combater práticas indesejáveis por meio da "certificação". Isso vale para o trabalho e para o meio ambiente e também para a cultura.
No caso do trabalho e do meio ambiente, os referidos movimentos instigam os consumidores e os cidadãos a rotularem as empresas de "respeitosas" e "desrespeitosas", "humanas" e "desumanas", "boas" e "más". Ninguém gosta de carregar rótulos depreciativos. Mas, é interessante entender a força que isso produz.
Em um ambiente altamente competitivo – como ocorre na economia atual – essa rotulação leva as empresas a fazerem de tudo para evitar um estereótipo negativo.
No início, a reação é defensiva. Mas, com o passar to tempo, ela se torna pró-ativa. Surge nas empresas uma governança que saí em busca de ganhar uma imagem positiva por meio de suas próprias iniciativas. É dessa forma que vão proliferando as inovações no campo dos investimentos voluntários.
Há um mecanismo ainda mais interessante. Para quem vive em um mundo concorrencial – como o atual –, os empresários procuram atrair outros empresários. Afinal, ninguém quer investir continuamente quando seu concorrente não investe. Ninguém gosta de concorrência desleal. Por isso, os primeiros procuram atrair outros empresários, fazendo crescer o numero dos que assumem compromissos com o social. É uma espécie de auto-regulação com força estimulante no próprio meio empresarial.
Em outras palavras, a força da pressão inicial dos consumidores e dos cidadãos é transferida para os empresários que, por si mesmo, buscam a maior adesão possível de outros empresários, formando um circulo virtuoso. Uma espécie de bola de neve. Sim, porque o pior dos mundos é quando um empresário adere e seu concorrente não adere.
Para evitar essa situação, os próprios empresários passam a ser vigilantes do que fazem os seus concorrentes, atraindo-os, com toda a força, para o sistema de investimentos voluntários. Em outras palavras, os empresários passam a ser uma fonte de atração dos próprios empresários. Essa é a tendência natural, mas ela pode ser precipitada por meio de programas bem orientados.
Há vários exemplos desse tipo de ação no campo do trabalho. Os ataques à exploração do trabalho infantil da Nike na década de 90, por exemplo, levaram a empresa a exigir o respeito às proteções trabalhistas e previdenciárias no âmbito de seus fornecedores.
Da mesma forma, os grandes consumidores de aço passaram a exigir das siderúrgicas a comprovação de inexistência de trabalho infantil nos processos iniciais de mineração.
Os estilistas famosos passaram a demandar dos produtores das confecções que levavam a sua etiqueta, um mínimo de respeito às cláusulas sociais.
No campo do meio ambiente, os grandes revendedores de móveis passaram a requerer o "selo verde", comprovante de um manejo florestal racional. As grandes cadeias de supermercados e shopping centers, fizeram o mesmo.
Embora não muito visível, isso se prolifera em todos os setores, inclusive o setor social dentro do qual está a cultura.
Dois trabalhos publicados pelo IPEA em 2007 procuraram identificar o comportamento das empresas no campo dos investimentos voluntários na área cultural (IPEA, Economia e Política Cultural: acesso, emprego e financiamento; IPEA, Política Cultural no Brasil 2002-2006: acompanhamento e análise, Brasília: Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, 2007).
Essas pesquisas mostraram que entre 1990 e 2004, os investimentos voluntários no campo social aumentaram 10 pontos percentuais, saindo de 59% para 69%. Ou seja, quase 70% das empresas brasileiras indicaram estar fazendo algum tipo de investimento voluntário naquela área. No total, as empresas brasileiras investiram cerca de R$ 4,7 bilhões em 2004, ou seja, 0,27% do PIB. É um número apreciável, sendo cerca de 15% das despesas das famílias no campo da cultura (R$ 32 bilhões anuais).
O importante, porém, é a proporção das empresas socialmente sensíveis está crescendo. Nos campos da educação e do lazer, o crescimento foi de 12%. As mesmas pesquisas indicaram a disposição das empresas (43% delas) em aumentar tais investimentos nos próximos anos.
A maior parte dos recursos vai para programas ligados à infância, em especial, os de alimentação, saúde e assistência social. Ao lado dos investimentos diretos, há os recursos financeiros e humanos aportados pelas várias entidades empresariais como é o caso do SESI, SESC e outras.
As empresas informaram nessa pesquisa que desejam manter uma boa imagem pública, em especial, nas comunidades onde operam.
É verdade que os investimentos não são constantes ou articulados e que há poucas parcerias e pouca participação dos empregados nos programas sociais mantidos pelas empresas. Mas o grosso do investimento é feito com recursos próprios. Apenas 2% das empresas pesquisadas utilizaram incentivos fiscais. Muitas delas alegaram investir parcelas pequenas o que não justifica enfrentar a burocracia dos programas governamentais. Outras, demonstraram desconhecer os benefícios de tais programas.
O que se pode concluir disso? Há uma tendência crescente de investimentos voluntários baseada no exercício da boa cidadania por parte das empresas.
Mas há determinadas dimensões que poderiam ser mais trabalhadas. Muitas empresas ainda não se deram conta de que o envolvimento dos seus funcionários em atividades culturais melhora o seu desempenho, cria um ambiente de trabalho mais humano, ajuda a integração dos grupos, desenvolve a criatividade das pessoas, desperta novos talentos, alavanca o senso estético, enaltece a beleza e estimula a engenhosidade.
Tudo isso se reflete no ambiente social e também no desempenho dos próprios funcionários. Há aqui, embutida, uma função econômica que caminha junto com a função social. Isso traz novos valores, hábitos e atitudes que, no final, se convertem em mais comprometimento com a empresa e com o trabalho.
O mercado de trabalho está cada vez mais exigente. Para ser recrutado e promovido não basta ao empregado conhecer bem a sua profissão. Além disso, ele precisa ter condutas adequadas; ter zelo em tudo o que faz; ter gosto pelo fazer bem feito; enfim, ter as qualidades que são inerentes ao artista, cujo desafio constante é superar a si mesmo.
Esses traços comportamentais se espalham também pelas comunidades, o que facilita a vida das empresas na hora de recrutar e promover pessoal, melhorando, em conseqüência, a articulação entre empresa e sociedade em geral.
Enfim, a melhoria do lado humano tem valor em si mesmo. E tem também um valor econômico que a empresa moderna não pode desprezar.
Aos poucos, a área cultural poderá chegar no estágio da regulação privada – da mesma forma que as empresas procuram se auto-regular para respeitar os direitos fundamentais dos trabalhadores e o meio ambiente. Deixo aqui uma sugestão aos participantes: a de explorarem a possibilidade da área da cultural adotar o modelo de auto-regulação que está apresentando bons resultados no trabalho e no meio ambiente, lembrando que, na sociedade moderna, a imagem é o mais precioso ativo da empresa – é o valor da reputação.
Na mesma linha, lanço como objetivo futuro, o fortalecimento da idéia da certificação cultural. O sistema de certificação é uma forma viável para responder a demandas, riscos e incertezas. A certificação cria o "clube do bem" que só funciona quando é operado com base em um grande número de associados.
Quando esses princípios são estabelecidos, a consciência empresarial amadurece, as empresas ganham respeitabilidade, a sua reputação se fortalece e as chances para sobreviver e crescer em um mercado competitivo aumentam. É a força dos valores espirituais da determinação do sucesso econômico – tema tão bem explorado por Max Weber na Ética do Espírito Capitalista. Estaria aí o caminho para se humanizar a globalização e se consolidar um capitalismo respeitoso? Penso que sim.


Comentários

  1. Eu juro!
    Eu juro Fada!
    Que vou ler e tentar comentar amanhã tá??

    bj e Boa noite

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Ana Lucília
    Que texto demais ! Eduardo Paes faz sempre questão de dizer que é casado, pai de família, respeitado... Como se o fato de ser pai de família fosse um nada consta em sua caminhada política !

    Quantos corruptos, traficantes, bandidos de toda a espécie, também são "pais de família"?

    Por acaso,desde quando estado civil passou a ser prerrogativa de bom caráter?

    Um beijo e que Deus nos ajude nesse próximo domingo e nos próximos mandatos !!!

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  5. Espero que empresários acessem o blog ou leiam por outros caminhos, mas que possam aprender com a aula de ética e esperança. Desejo imaginar um tempo em que a cultura saia pelos poros e se respire o cheiro bom da arte em todas as suas possibilidades.
    Creio que os caminhos são sempre menos áridos que os vivenciados, resta - nos trilhar.
    Humanizar só acontece tocando, a indiferença é a ausência de afeto.

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  6. Zizi...durante o trabalho,não resisti e entrei no blog..."tipo" momento prá relaxar o espírito.Aí me deparei com um enorme texto e levei um susto...rs...afinal,só desejava um "relax"!!Mas não resisti à tentação e busquei a máxima concentração possível e disponível no momento para assim desbravá-lo...e foi muito proveitoso!!Confesso que retornei a leitura em alguns trechos para entender,pensar,aprender e concordar....(valem suas idéias,e ele tem razão).Pastore é uma pessoa de grande saber...uma sumidade!!Aproveitando a oportunidade,acrescento que José Possi,teu querido irmão,olha aí a genética,é sobretudo um notável diretor....."O Baile",já havia assistido o filme em VHS (de Ettore Scola)e descobri com o trabalho do Possi que todas as montagens de peça devem retratar a história do país em que forem encenadas...totalmente inusitado,fantástica esta exigência de Penchenat(detentor dos direitos)!!Fica aqui um grande "bravo" para ele e para o Possi que trouxe o espetáculo para o nosso conhecimento.PS:Que o "gene"dos Possi perpetue para o bem das próximas gerações...é pura arte!!Um grande beijo,Iracema.

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  7. Bens Culturais = Patrimônio Cultural

    Bens Culturais ou Patrimônio Cultural são testemunhos da nossa realidade e é través da história contada por eles que compreendemos melhor o nosso passado, que é facilitado para o entendimento do presente, bem como o Futuro. O conceito de Patrimônio tem um significado muito próximo à noção de herança, algo que vai ser transmitido de uma geração para outra. Refletir sobre a preservação, revitalização e valorização do Patrimônio Material (tangível) e Imaterial (intangível) é pensar em uma continuidade perpetuada pelo homem, agente e sujeito da sua história local e/ou regional. Durante muito tempo o conceito de Patrimônio restringia-se apenas as edificações: igrejas, palácios etc., Como isso acontecia? E como mudou?

    Um breve histórico
    Para a ampliação do centro de São Paulo seriam necessárias demolições de casarios, alguns conhecidos e reconhecidos pelo valor sentimental e histórico da cidade. Para determinar o que seria demolido e o que permaneceria, foram realizados vários encontros em prol de estabelecer meios para tal questão. A partir de tais questionamentos ocorreu em 1920 a criação do SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico Artístico Nacional) que teria nessa época, funcionários voltados para a área da Arquitetura e que veicularam a noção de patrimônio: “Somente o Edificado”. No entanto, a partir de 1936, ocorreram debates sobre a preservação cultural e artística no Brasil, gerando algumas divergências entre profissionais, por isso, o então Presidente Getúlio Vargas convidou Mário de Andrade como mediador das discussões. A partir de 1937, o SPHAN, passa de Serviço para Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN. Após este ano acontecem em todo o mundo encontros que visam à preservação do Patrimônio e suas características, como também, são elaborados documentos que dão diretrizes e bases para preservação do Patrimônio. Em 1938, Andrade organiza a Missão de Pesquisas Folclóricas com o objetivo de catalogar músicas do Norte e Nordeste e que resulta em um vasto acervo de vídeo, áudio etc., dos lugares visitados.
    Ainda em 1938, várias questões sobre a ampliação do conceito de patrimônio vieram para as salas de discussões. Contudo, só em 1988 a Constituição Federal, obedecendo a princípios normativos, passou a contemplar os bens intangíveis (Patrimônio imaterial) de uma sociedade, como por exemplo, formas de expressão; de seus modos de criar, fazer e viver; das criações científicas, artísticas e tecnológicas; conjuntos urbanos, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais.
    Hoje, graças a Ampliação do Conceito de Patrimônio temos o Patrimônio Cultural de Natureza Material (tangível) que é composto pelos bens concretos móveis e imóveis e o Patrimônio de Natureza Imaterial (intangível) que é composto pelos bens não-concretos.

    Existe uma vertente que busca a preservação do ser humano, por isso, considero pertinente e correto o pensamento do José Possi Neto sobre “a necessidade de se criar escolas para preparar os jovens na arte da marcenaria dos cenários, nos segredos da costura dos figurinos, nas técnicas de iluminação e sonorização de um espetáculo e tantas outras atividades que, apesar de não aparecerem na ribalta, são as que garantem a boa qualidade dos espetáculos.” Seguindo essa vertente, que muito me agrada, trago para vocês um lindo exemplo do livro “Dona Flor e Seus 2 Maridos”: (Bilhete recente de Dona Flor para o Romancista).
    “Caro amigo Jorge Amado, o bolo de puba que eu faço não tem receita, a bem dizer. Tomei explicação com dona Alda, mulher de seu Renato do Museu, e aprendi fazendo, quebrando a cabeça até encontrar o ponto. (Não foi amando que aprendi a amar? Não foi vivendo que aprendi a viver?)”.

    Zizi, muito bacana o texto, muito obrigada por disponibilizá-lo.

    PS: Seguindo o diálogo sobre o Patrimônio, recomendo o filme: Os Narradores de Javé.

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  8. Ana, gostei muito do texto da Marli Gonçalves.
    Pat

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